Por Osvaldo Simonelli
Assunto: Honorários Médicos.
Ementa: Consulta na área da saúde. Cobrança de honorários médicos de forma antecipada. Ausência de óbice sob o ponto de vista ético e consumerista. Possibilidade com ressalvas.
Trata-se, em apertada síntese, de situação envolvendo questionamento quanto a possibilidade/viabilidade de cobrança antecipada de honorários médicos em consultas.
Ab initio, é fundamental destacarmos que a presente análise exclui procedimentos decorrentes dos contratos firmados entre o médico, ou sua clínica, e os respectivos planos e operadoras de saúde, na medida em que tais instrumentos convencionados entre as partes, invariavelmente, preveem as respectivas condições financeiras remuneratórias do serviço prestado aos pacientes/beneficiários, e devem ser analisados individualmente, diante do respcetivo caso concreto.
Pois bem.
A relação médico-paciente, segundo a Jurisprudência firme, em que pese alguns posicionamentos contrários na doutrina especializada, é pautada pelas regras consumeristas, com incidência, portanto, do Código de Defesa do Consumidor.
Nesta senda, a questão perpassa por dois ambientes jurídicos muito claros, no que diz respeito ao pagamento dos honorários pela prestação dos serviços médicos: o campo ético e o campo das relações de consumo.
Dentre o arcabouço de normas que regulam a profissão médica, mormente as Resoluções Administrativas emanadas pelo Conselho Federal de Medicina, não há previsão específica a respeito de tal ponto da relação com o paciente.
Neste sentido, não havendo vedação expressa no âmbito ético, ao médico é permitido fazer, seguindo a máxima jurídica, decorrente do princípio constitucional da legalidade, de que, ao particular, é permitido tudo quanto a norma não proíbe.
O Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará, ao enfrentar a questão, o fez de maneira bastante elucidativa, por intermédio do Parecer CREMEC 20/2020, a partir do Protocolo n. 10637/2019, cuja conclusão restou assim ementada:
“EMENTA: A cobrança antecipada de honorários médicos, feita durante o agendamento da consulta, não é recomendável porque coloca os honorários à frente da relação médico/paciente, indo de encontro ao prestígio e bom conceito da profissão. Não existe impedimento ético à cobrança de consulta médica no ato do agendamento. Entretanto, não se consumando a consulta o médico deverá devolver o valor cobrado ao paciente ou remarcá-la.”
No corpo do mencionado parecer, o respectivo Regional destaca a redação do artigo 59 do Código de Ética Médica (Resolução CFM n. 2.217/18), cujo teor assim define:
“É vedado ao médico:
Art. 59 Oferecer ou aceitar remuneração ou vantagens por paciente encaminhado ou recebido, bem como por atendimentos não prestados.” (sem destaques no original).
Nesse toar, é de suma importância que, em eventual cobrança antecipada de honorários, o médico possua um sistema de controle efetivo em seu consultório e, principalmente, esclarecimento ao paciente quanto à possibilidade de devolução ou remarcação da consulta.
Sob o ponto de vista ético, portanto, não vislumbramos impedimento ao estabelecimento de uma rotina/protocolo de cobrança antecipada de honorários, com as ressalvas ora postas.
A legislação consumerista não prevê nenhuma regra específica, sendo que, utilizando-se de uma situação paradigma, podemos analisar a questão sob o viés da reserva de horário junto à clínica, como ocorre em outros setores da economia.
Ao fazer a reserva do horário, o paciente passa a ser detentor daquele período de dedicação do profissional, sendo que o pagamento antecipado pode ser considerado como uma espécie de “taxa de reserva”, evitando-se que o profissional sofra um prejuízo direto e, indiretamente mas igualmente relevante, prejudique outro paciente que poderia ocupar aquele horário.
A utilização de um sistema de reserva, com pagamento antecipado, faz com que o paciente assuma o compromisso de estar presente no horário previamente agendado ainda que o médico tenha que, na ausência deste, remarcar a consulta.
Entretanto, uma ressalva deve ser feita de forma bastante contundente: não se pode, jamais, exigir qualquer recebimento prévio em situações de urgência ou emergência, assim entendidas aquelas em que há um risco potencial à vida. [1] [2]
Assim, sob o viés consumerista, não há regramento que impeça a cobrança antecipada dos honorários médicos, sempre com a ressalva de que o consumidor não pode ser prejudicado por tal pagamento, sob a mesma ótica do ponto de vista ético, como indicado alhures.
Destarte, é de se destacar que há medidas e protocolos internos que podem diminuir a abstenção nos consultórios médicos – como confirmação antecipada, lista de espera para encaixes, bem como o devido esclarecimento ao paciente, já no agendamento da consulta, quanto a necessidade seu comparecimento para que não haja prejuízos a outros que possam estar precisando, também, do atendimento profissional.
Diante de tudo quanto exposto e respeitando posicionamentos contrários, entendemos como sendo viável, sob o ponto de vista ético e consumerista, a utilização de cobrança antecipada de honorários médicos, com todas as ressalvas acima expostas, inclusive a implementação de outras medidas em conjunto a reduzir a abstenção nos consultórios.
É o parecer, s.m.j.
São Paulo, 5 de fevereiro de 2021.
Osvaldo Simonelli[3]
OAB [Subseção São Paulo] n. 165.381.
O presente parecer é produzido para fins acadêmicos e profissionais. É baseado em situações hipotéticas, sendo que qualquer semelhança com casos concretos é mera coincidência. Pode ser reproduzido total ou parcialmente citando-se a fonte da seguinte forma:
<http://localhost/sites/simonelli/site-tmp/blog/> Parecer Jurídico n. 03/2021. Autoria: Osvaldo Simonelli. Instituto Paulista de Direito Médico e da Saúde.
2.1 Emergência: Constatação médica de condições de agravo a saúde que impliquem sofrimento intenso ou risco iminente de morte, exigindo portanto, tratamento médico imediato.
2.2 Urgência: Ocorrência imprevista de agravo a saúde com ou sem risco potencial a vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata. ↑
Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial
Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte. ↑
Pós-Graduado em Direito Público. Pós-Graduado em Direito Processual Civil. Mestre em Ciências da Saúde. Idealizador do Instituto Paulista de Direito Médico e da Saúde – IPDMS®.
Idealizador do Programa de Formação em Direito Médico®. ↑O Prof. Me. Osvaldo Simonelli é advogado, formado em 1998, pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.