PARECER JURÍDICO N. 03/2021. O.S.

Por Osvaldo Simonelli


Assunto: Honorários Médicos.

Ementa: Consulta na área da saúde. Cobrança de honorários médicos de forma antecipada. Ausência de óbice sob o ponto de vista ético e consumerista. Possibilidade com ressalvas.

1. Breve Resumo dos Fatos.

Trata-se, em apertada síntese, de situação envolvendo questionamento quanto a possibilidade/viabilidade de cobrança antecipada de honorários médicos em consultas.

2. Do Parecer Jurídico.

Ab initio, é fundamental destacarmos que a presente análise exclui procedimentos decorrentes dos contratos firmados entre o médico, ou sua clínica, e os respectivos planos e operadoras de saúde, na medida em que tais instrumentos convencionados entre as partes, invariavelmente, preveem as respectivas condições financeiras remuneratórias do serviço prestado aos pacientes/beneficiários, e devem ser analisados individualmente, diante do respcetivo caso concreto.

Pois bem.

A relação médico-paciente, segundo a Jurisprudência firme, em que pese alguns posicionamentos contrários na doutrina especializada, é pautada pelas regras consumeristas, com incidência, portanto, do Código de Defesa do Consumidor.

Nesta senda, a questão perpassa por dois ambientes jurídicos muito claros, no que diz respeito ao pagamento dos honorários pela prestação dos serviços médicos: o campo ético e o campo das relações de consumo.

2.1. Da Análise sob o ponto de vista ético.

Dentre o arcabouço de normas que regulam a profissão médica, mormente as Resoluções Administrativas emanadas pelo Conselho Federal de Medicina, não há previsão específica a respeito de tal ponto da relação com o paciente.

Neste sentido, não havendo vedação expressa no âmbito ético, ao médico é permitido fazer, seguindo a máxima jurídica, decorrente do princípio constitucional da legalidade, de que, ao particular, é permitido tudo quanto a norma não proíbe.

O Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará, ao enfrentar a questão, o fez de maneira bastante elucidativa, por intermédio do Parecer CREMEC 20/2020, a partir do Protocolo n. 10637/2019, cuja conclusão restou assim ementada:

“EMENTA: A cobrança antecipada de honorários médicos, feita durante o agendamento da consulta, não é recomendável porque coloca os honorários à frente da relação médico/paciente, indo de encontro ao prestígio e bom conceito da profissão. Não existe impedimento ético à cobrança de consulta médica no ato do agendamento. Entretanto, não se consumando a consulta o médico deverá devolver o valor cobrado ao paciente ou remarcá-la.”

No corpo do mencionado parecer, o respectivo Regional destaca a redação do artigo 59 do Código de Ética Médica (Resolução CFM n. 2.217/18), cujo teor assim define:

“É vedado ao médico:

Art. 59 Oferecer ou aceitar remuneração ou vantagens por paciente encaminhado ou recebido, bem como por atendimentos não prestados.” (sem destaques no original).

Nesse toar, é de suma importância que, em eventual cobrança antecipada de honorários, o médico possua um sistema de controle efetivo em seu consultório e, principalmente, esclarecimento ao paciente quanto à possibilidade de devolução ou remarcação da consulta.

Sob o ponto de vista ético, portanto, não vislumbramos impedimento ao estabelecimento de uma rotina/protocolo de cobrança antecipada de honorários, com as ressalvas ora postas.

2.2. Da análise sob o ponto de vista do Código de Defesa do Consumidor.

A legislação consumerista não prevê nenhuma regra específica, sendo que, utilizando-se de uma situação paradigma, podemos analisar a questão sob o viés da reserva de horário junto à clínica, como ocorre em outros setores da economia.

Ao fazer a reserva do horário, o paciente passa a ser detentor daquele período de dedicação do profissional, sendo que o pagamento antecipado pode ser considerado como uma espécie de “taxa de reserva”, evitando-se que o profissional sofra um prejuízo direto e, indiretamente mas igualmente relevante, prejudique outro paciente que poderia ocupar aquele horário.

A utilização de um sistema de reserva, com pagamento antecipado, faz com que o paciente assuma o compromisso de estar presente no horário previamente agendado ainda que o médico tenha que, na ausência deste, remarcar a consulta.

Entretanto, uma ressalva deve ser feita de forma bastante contundente: não se pode, jamais, exigir qualquer recebimento prévio em situações de urgência ou emergência, assim entendidas aquelas em que há um risco potencial à vida. [1] [2]

Assim, sob o viés consumerista, não há regramento que impeça a cobrança antecipada dos honorários médicos, sempre com a ressalva de que o consumidor não pode ser prejudicado por tal pagamento, sob a mesma ótica do ponto de vista ético, como indicado alhures.

Destarte, é de se destacar que há medidas e protocolos internos que podem diminuir a abstenção nos consultórios médicos – como confirmação antecipada, lista de espera para encaixes, bem como o devido esclarecimento ao paciente, já no agendamento da consulta, quanto a necessidade seu comparecimento para que não haja prejuízos a outros que possam estar precisando, também, do atendimento profissional.

3. Conclusão do parecer (opinio iuris).

Diante de tudo quanto exposto e respeitando posicionamentos contrários, entendemos como sendo viável, sob o ponto de vista ético e consumerista, a utilização de cobrança antecipada de honorários médicos, com todas as ressalvas acima expostas, inclusive a implementação de outras medidas em conjunto a reduzir a abstenção nos consultórios.

É o parecer, s.m.j.

Desenho com traços pretos em fundo branco

Descrição gerada automaticamente com confiança média

São Paulo, 5 de fevereiro de 2021.

Osvaldo Simonelli[3]

OAB [Subseção São Paulo] n. 165.381.

O presente parecer é produzido para fins acadêmicos e profissionais. É baseado em situações hipotéticas, sendo que qualquer semelhança com casos concretos é mera coincidência. Pode ser reproduzido total ou parcialmente citando-se a fonte da seguinte forma:

<http://localhost/sites/simonelli/site-tmp/blog/> Parecer Jurídico n. 03/2021. Autoria: Osvaldo Simonelli. Instituto Paulista de Direito Médico e da Saúde.

  1. PORTARIA MS/GM Nº 393, DE 13 DE MARÇO DE 2020

    2.1 Emergência: Constatação médica de condições de agravo a saúde que impliquem sofrimento intenso ou risco iminente de morte, exigindo portanto, tratamento médico imediato.

    2.2 Urgência: Ocorrência imprevista de agravo a saúde com ou sem risco potencial a vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata.

  2. Código Penal.

    Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial

    Art. 135-A.  Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial:

    Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

    Parágrafo único.  A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.

  3. Advogado. Jornalista.

    Pós-Graduado em Direito Público. Pós-Graduado em Direito Processual Civil. Mestre em Ciências da Saúde. Idealizador do Instituto Paulista de Direito Médico e da Saúde – IPDMS®.

    Idealizador do Programa de Formação em Direito Médico®.

Oswaldo Simonelli

O Prof. Me. Osvaldo Simonelli é advogado, formado em 1998, pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.

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